Assembleia Legislativa pode votar PEC que permite "demissão" de conselheiro - Bolsão News

Assembleia Legislativa pode votar PEC que permite “demissão” de conselheiro

O afastamento dos conselheiros Iran Coelho das Neves, Ronaldo Chadid e Waldir Neves do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul (TCE-MS), desde o dia 8 de dezembro do ano passado, por serem investigados em suposta trama de corrupção que teria desviado mais de R$ 100 milhões, pode resultar na votação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (Alems) que permita a “demissão” de conselheiros alvos de ações judiciais que resultem em afastamento da Corte de Contas.

A iniciativa foi anunciada na manhã de ontem, durante a sessão da Casa de Leis, pelo deputado estadual Coronel David (PL), avisando já ter determinado que sua assessoria jurídica faça um estudo a respeito da apresentação dessa PEC para alterar a Constituição de Mato Grosso do Sul, dando poder ao Legislativo do Estado para agir em casos que envolvem os conselheiros do TCE-MS, da mesma forma que o Senado tem a prerrogativa constitucional de solicitar impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Além disso, o parlamentar ainda apresentou um requerimento, já assinado por outros oito deputados estaduais, solicitando a criação de uma Comissão Temporária de Representação para acompanhar o inquérito e o eventual processo judicial contra os três conselheiros.

“Estão sendo feitos julgamentos das contas dos municípios, principalmente, por auditores que não têm a competência originária de julgar tais processos. O TCE-MS é um órgão auxiliar da Casa de Leis e precisamos prezar o maior mandamento desta Casa, que é a fiscalização”, disse, lembrando que, em junho deste ano, o ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acatou apelação da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Maria Araújo, e prorrogou por mais um ano o afastamento dos conselheiros.

“Com a decisão, os conselheiros devem ficar longe da Corte até 8 de junho de 2024, ou seja, o TCE-MS vai continuar desfalcado, restando apenas quatro conselheiros atuando na fiscalização dos gastos dos 79 municípios”, lamentou o parlamentar.

CONSTITUCIONALISTAS
O Correio do Estado procurou a opinião de dois advogados constitucionalistas sobre a proposta do deputado estadual Coronel David e, na avaliação de Jodascil Gonçalves, de fato o pedido é legítimo e é função da Assembleia Legislativa propor discutir, votar e eventualmente aprovar alterações na Constituição Estadual por meio de PEC.

“O Artigo 65 do processo legislativo da Casa de Leis, inciso 1º, já traz a competência de apreciar e de propor PEC, sendo que no seu artigo subsequente, o Artigo 66, trata exatamente da matéria de emenda à Constituição Estadual. Portanto, os legitimados para proporem a alteração na Constituição de Mato Grosso do Sul, dentre eles, nós temos justamente os membros da Assembleia Legislativa”, ressaltou o advogado constitucionalista.

Ele prossegue, acrescentando que o inciso 1º do Artigo 66 diz que a proposta pode vir da própria Assembleia Legislativa por meio da representação de um terço dos seus membros. “Então é necessário que o deputado reúna um terço dos seus pares para que faça a Proposta de Emenda à Constituição. O parágrafo 2º traz qual é o quórum e qual o procedimento para essa aprovação. Então, para que seja feita uma emenda à Constituição Estadual é necessário que seja discutida e votada em duas sessões com a aprovação em cada uma delas por dois terços dos votos e aí sim pode ser alterada a Constituição Estadual”, detalhou o rito.

Quanto ao pleito do parlamentar estadual, Jodascil Gonçalves informou ao Correio do Estado que o considera legítimo, pois o fato de o Senado Federal ter essa competência no âmbito federal permite uma simetria da Constituição de Mato Grosso do Sul com a Constituição do Brasil, trazendo essa competência para a Assembleia Legislativa através de uma PEC.

“É importante lembrar que o Legislativo federal é bicameral, tendo duas casas de Lei, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, mas somente o primeiro tem a prerrogativa de impeachment contra ministros do STF, enquanto o Legislativo estadual só tem a Assembleia, sendo correto trazer essa competência para a Casa de Leis do Estado”, opinou o constitucionalista.

No entendimento do professor de Processo Penal e Filosofia do Direito, advogado Benedicto Arthur de Figueiredo Neto, o impeachment é um instituto que foi criado na Constituição do Brasil de 1946, em que a Lei Federal n° 1.079/50 veio regulamentar o tema proposto na Constituição daquela época, a fim de que fosse “cassado” o mandato do presidente da República por crime de responsabilidade, matéria essa a ser dirimida por lei federal.

“Na história dos impeachments Café Filho e Carlos Luz foram os primeiros chefes de Estado a sofrerem o impacto dessa lei, muito embora o julgamento de ambos tenha sido feito muito à margem do rito legal. Pois bem, com o advento da Constituição Federal de 1988, a Lei Federal nº 1.079/50 foi recepcionada e a previsão para o tema do impeachment continuava sendo apenas para o presidente da República, em que dois presidentes foram cassados pós 1988, Fernando Collor e Dilma Rousseff”, disse.

Ele destacou que a Lei 1.079/50 não prevê a possibilidade de impeachment a qualquer outro cargo, senão ao presidente da República. “Pensando nisso, o senador Rodrigo Pacheco propôs o Projeto de Lei nº 1.388/2023, em março desse ano, a fim de alargar o leque e aqui incluir os conselheiros das Cortes de Contas dos Estados (art. 2º, XIV). A proposta feita pelo deputado Coronel David na data de ontem tem pertinência legal, eis que vem concomitante ao PL 1.388/2023 de Pacheco, em que esta prevê a possibilidade no seu art. 25 da abertura de processos por responsabilidade às Assembleias Legislativas a membros dos Tribunais de Contas, mas que ainda não está regulamentado por lei federal”, detalhou.

Dessa feita, completou Benedicto Arthur de Figueiredo Neto, “o estudo do tema proposto pelo parlamentar é salutar, atual e extremamente moderno”. “Eis que a partir da deliberação do Congresso Nacional sobre o PL 1.388/2023, e que se o tema for aprovado e transformado em lei federal, Mato Grosso do Sul estará na vanguarda desse novo modelo de impeachment, com um novo rito processual, porém, a proposta estadual para entrar em vigor necessita de deliberação do tema pelo Congresso Nacional, como já alertou Pacheco na construção do Projeto de Lei 1.388/2023”, finalizou.

Fonte: CorreioDoEstado

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