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Encontrado morto na quarta-feira, estudante foi vítima de crime de ódio, acredita delegado

Segundo o delegado adjunto da Delegacia Especializada em Homicídios da Polícia Civil e responsável pelas investigações, Danilo César foi mais uma vítima de homofobia.

Danilo César, de 29 anos, foi vítima de crime de ódio – Reprodução/Redes Sociais

Danilo César, de29 anos, assassinado no último domingo (05), foi vítima de um crime de ódio. O responsável pela investigação do caso, o delegado Jose Roberto Junior, da  Delegacia Especializada de Homicídios da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul (PCMS), em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, afirmou que Danilo foi vítima do crime de homofobia.

A principal linha de investigação da PCMS, segundo o delegado, é a de que Danilo (Carinhosamente conhecido como “Dan”, por seus amigos e familiares) foi vítima do crime de ódio.

Conforme a PCMS, o suspeito confessou o crime, e será indicado por homicídio doloso, por motivo torpe, por asfixia e sem chance de defesa da vítima. Ele foi preso em flagrante pelo crime de ocultação de cadáver.

Dan ficou desaparecido por três dias, seus amigos e familiares organizaram uma força-tarefa para tentar localizá-lo, desde o dia de seu desaparecimento, no sábado (04) e, após esse período, a polícia encontrou a vítima já sem vida.

“Dan”, era motivado por questões sociais e discussões que fomentavam a ciência, era pesquisador e intelectual, dedicado e “questionador, astuto e levava a ciência a sério”, segundo seus familiares.

Além disso, era mestrando e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pesquisador, formado em Ciências Sociais, pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), já foi bolsista do Programa de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PIBIC/CNPQ).

Era um intelectual que colaborava com grupos de pesquisa como, o Laboratório de Antropologia Visual Alma do Brasil (LAVALMA) e o Grupo de Estudos Fronteiriços (GEF), ambos da UFMS.

No que diz respeito ao crime de homofobia, o Correio do Estado entrou em contato com o o pesquisador e professor titular de Ciências Sociais da UFMS, Tiago Duque e, para ele, o crime de homofobia trata-se de uma produção cultural. 

“A sociedade produz ódio, esse tipo de crime é uma experiência cultural, portanto ela (a sociedade) vai continuar produzindo ódio, e isso muda através das políticas públicas direcionadas à essa comunidade, às minorias”, destaca.

Ainda conforme o pesquisador, a motivação de ódio, que resultou no assassinato de Dan, perpassa questões de gênero e sexualidade e diz que, por se tratar de um crime de homofobia, o Estado deve investir em políticas públicas que fomentam a educação, a conscientização contra as questões que perpassam as comunidades que são ditas como minoria.

Duque diz que o ódio não é uma motivação racional, “mas sim cultural”.

Moção de Pesar na Câmara

Partindo da gravidade e das motivações que levaram ao assassinato de Dan, o vereador Beto Avelar (PSD) apresentou uma nota de pesar aos familiares na sessão da Câmara vereadores da Capital nesta manhã. A iniciativa foi aprovada pelo plenário.

Veja a moção na íntegra:

“Moção de pesar aos familiares de Danilo César de Jesus Santos, o sempre doce e alegre Dan, como era mais conhecido, que com apenas 29 anos veio a falecer tragicamente, deixando destruídos e inconsoláveis. 

Danilo era graduado em Ciências Sociais e cursava mestrado. Fazia parte do laboratório de antropologia visual Alma do Brasil e do grupo de estudos fronteiriços da UFMS. Sempre educado, doce, crítico ao cenário social e político.

Dan era LGBTQIA+, o qual combatia o preconceito e edificava a ciência, que perde então uma voz que contribuiria significativamente para a nossa sociedade.

Ele parte deixando a sua mãe, dona Maria Lúcia, e a todos nós muitas lições de amor, inclusão e coletividade, fica seu legado de uma linda luta por uma sociedade melhor, além da admiração e saudade por todos que o conheceram. 

O Dan, vamos chamar de Dan carinhosamente, como até, inclusive meu filho que também é homossexual e convivia com ele”.

Nota à imprensa

A morte de Daniel, gerou repercussão e a rede e, além de se tratar de uma vítima do ódio e em situação de vulnerabilidade, seus familiares e amigos construíram uma rede de apoio a ele.

Pela fragilidade do tema, foi divulgado por eles uma nota à imprensa sobre o caso.

Correio do Estado teve acesso à nota e, abaixo, segue na íntegra:

“A rede de apoio à família e amigos de Danilo Cezar de Jesus Santos, vítima de homicídio no domingo (5 de março), vem a público fazer um pedido aos profissionais de imprensa e à sociedade civil.

Diante dos inúmeros comentários maldosos a respeito de Danilo, acreditamos que não seja producente ou respeitoso, para com a memória da vítima, divulgar com destaque as falas do autor do crime em tom de “jornalismo declaratório”, já que a própria investigação aponta contradições em seu depoimento e, sobretudo, porque Danilo não está presente materialmente para dar sua versão.

É importante ressaltar que Danilo era um jovem dedicado e de trajetória exemplar, que veio da periferia e tinha o sonho de melhorar a vida de sua mãe, uma trabalhadora doméstica que se dedicou ao máximo à educação do filho. Aluno aplicado, Danilo conseguiu cursar mestrado com bolsa e pretendia seguir a carreira acadêmica com doutorado.

Além disso, a vítima também era uma pessoa extremamente solidária e acolhedora, que fazia da ajuda ao próximo sua missão de vida. Matérias e comentários que questionem a recepção dada por Danilo a uma pessoa em situação de rua são insensíveis em relação ao modo como ele via o mundo, uma vez que suas convicções jamais permitiriam negar auxílio a quem o abordasse alegando precisar de ajuda.

Danilo tinha uma potência intelectual extraordinária. No mestrado em Antropologia Social, investigava o cotidiano de estudantes brasileiros/as de medicina na cidade de Pedro Juan Caballero (PY), na fronteira Paraguai-Brasil, além de ter sido pesquisador no grupo que formulou o dossiê para o registro de patrimônio imaterial nacional do Banho de São João em Corumbá e Ladário.

Como relatou seu orientador, Dr. Álvaro Banducci Jr., “sempre foi uma pessoa sensível e prestativa, além de humilde por comportamento e origem. Perde a Antropologia do MS, perdem os estudos fronteiriços, chora o São João”.

Danilo sempre foi responsável com suas obrigações, dentro de casa, na universidade e nas tarefas que desempenhava. A professora Dra. Mara Aline Ribeiro reforça a competência e dedicação de Danilo. “Um aluno excelente, um bolsista do CNPq. Um cara comprometido, o histórico escolar dele comprova isso”.

Danilo representa uma parte significativa e importante na vida daqueles que, com ele, compartilharam as experiências da vida vivida. Era sinônimo de gentileza, companheirismo e lealdade, com os amigos, com a família e com as suas causas. Pedimos respeito a sua memória, responsabilidade e compromisso com os desdobramentos da opinião pública.

No mais, é importante lembrar que Danilo prezava a não violência, era veementemente contra o assédio. Magro, de estrutura frágil, tinha consciência da sua vulnerabilidade. Ele costumava se manifestar ativamente contra qualquer tipo de discriminação, crime de ódio e intolerância. Conhecido na comunidade pela sua gentileza com os menos favorecidos, era amado e principalmente respeitado por todos que o conheciam.

São inúmeros os relatos de pessoas que tiveram a vida impactada positivamente pelas atitudes dele. Era carinhoso com os animais e sempre que possível encontrava forma de resgatá-los. Era cuidadoso e respeitoso com a mãe, tendo as iniciais da mesma tatuado no pulso. Tinha o sonho de transformar a vida dela através da educação, caminho que escolheu por aptidão. Era questionador, astuto e levava a ciência a sério”

*A rede de apoio aos familiares de Danilo Cezar é formada voluntariamente por amigos, parentes, colegas e professores da vítima.

Fonte: O Correio do Estado

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