Relatório da reforma tributária – a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45/2019 – apresentado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) deverá ser votado em julho e impactará na forma em que os contribuintes brasileiros pagam seus impostos. As novas regras têm gerado receio para o setor de serviços, que teme pagar tributos maiores, enquanto a agropecuária e exportações avistam possíveis reduções.
Se a reforma for adiante no atual formato – que será discutido, votado e poderá ser alterado -, brasileiros pagarão impostos embutidos nos preços de produtos e serviços de forma diferenciada. Em vez de serem tributados onde são fabricados, bens como um eletrodoméstico ou alimentos industrializados pagarão imposto no local onde são comprados.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que o projeto será apreciado no plenário na primeira semana de julho. A proposta precisa de 308 votos favoráveis, em dois turnos, para ser aprovada.
O advogado tributarista Clélio Chiesa comenta que a reforma gera embates, com pessoas contrárias e favoráveis, mas que representará ruptura grande com o sistema atual, o que exigiria novas leis e entendimentos jurídicos. “O que alguns criticam é que vamos perder a experiência que já temos em relação aos tributos que já existem e vamos partir para uma nova experiência, na qual, evidentemente, na sua implantação e ajustes, vai apresentar desdobramentos e problemas, o que é natural”.
Ele observa que há poucas unanimidades entre especialistas, no geral, mas o entendimento é que a carga tributária atual é muito elevada, o que motiva a tentativa de reformas, ainda que essencial para garantir os serviços básicos à população. “Me parece que uma redução só seria efetivamente alcançada com uma reforma mais profunda, uma reforma do próprio Estado”.
“Nós sabemos que numa conta simples, receita e despesa, não tem saída. Se você mantém o estado do tamanho que está, gastando o que está gasta, não há como se pensar em reduzir. Se as fontes reduzirem, vai faltar dinheiro e a conta não vai fechar. Portanto, é um alinhamento bastante difícil de se fazer, muito complicado. Deve-se manter o pacto federativo, há mais de 5 mil municípios e é uma dificuldade muito grande de articular e manter a coesão”.
Chiesa ressalta que estados e municípios têm realidades distintas, o que provoca críticas contra a uma reforma nacionalizada. “Fazer com que funcione bem numa realidade como essa é um desafio muito grande. Há uma centralização das receitas nas mãos da União e os estados e municípios se queixam. É um problema do nosso sistema”.
Se olharmos para uma questão histórica, os prejudicados são sempre os contribuintes. A carga tributária dificilmente reduz, ela na maioria das vezes aumenta. A ideia da reforma tributária é ampliar a base tributável”, explica o advogado tributarista Clélio Chiesa.
Vale ressaltar que os impostos alcançarão todas as bases de consumo, sejam bens materiais ou imateriais, de forma a atender a realidade da economia digital. “É um setor da economia que cresce muito e gera muito recurso. Por não ter tributação, portanto deveria, de alguma maneira, já que também está tendo resultado com essa atividade, ser tributado e que hoje, muitas vezes, fica de fora”, comenta Chiesa.
O doutor em Direito Tributário ressalta que um dos pontos que visa reduzir as disputas pelos impostos cobrados é a unificação dos tributos.
Unificação de impostos com a reforma tributária
Um dos pilares do relatório da reforma é a fusão de PIS, Cofins e IPI (tributos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que será chamado de IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
O sistema será “dual”. Isto é, uma parcela da alíquota será administrada pelo Governo Federal e a outra por estados e municípios. As alíquotas, porém, não foram apresentadas no projeto.
Ele destaca que, nos primeiros anos – em que estão previstos testes do novo modelo -, deverão ser analisados os pontos positivos e negativos. “Vamos, evidentemente, diminuir algumas complexidades, mas nós vamos trazer outras complexidades, com certeza. Todas as mudanças acentuadas de modo significativo criam essa ruptura. Elas têm uma resistência, uma dificuldade de funcionamento”.
A proposta prevê alíquotas diferenciadas, além da alíquota padrão, para bens e serviços específicos. Receberiam tratamento especial áreas como saúde, educação, transporte público, aviação regional e produção rural. O relatório não determina se a cesta básica terá alíquota própria, mas recomenda que seja avaliada a possibilidade.
Segundo o advogado tributarista, alguns setores devem sentir maior impacto que outros, tais como profissionais liberais com profissões regulamentadas. “São os que mais vão sofrer, pode aumentar a tributação deles. Mas no global, pode ser que venha a reduzir. Como são tributos indiretos, vão ser repassados nos preços, nos serviços”.
“Com um sistema que estava baseado na dualidade de venda de mercadoria e prestação de serviço, hoje vamos trabalhar com a base mais ampla, onde se contempla e se inclui outros serviços”.
A proposta diz que os impostos também podem ter alíquotas diferenciadas em função do tipo, do valor, da utilização e do impacto ambiental. Os tributos incidirão sobre a propriedade de veículos automotores terrestres, aquáticos e aéreos, com exceção de embarcações para serviços aéreos, transporte aquaviário ou pesca.
“A Constituição Federal não faz restrição a veículos automotores, então os outros tipos de veículos, em tese, poderiam ser tributados”.
Em nota, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) apoiou o projeto, como forma de estimular investimentos e produção e garantir a reindustrialização brasileira. Já a CNC (Confederação do Comércio) afirma apoiar a reforma, mas ressalta que não há mais espaço para aumento de tributos.
Exportação e importação
Os impostos não incidirão sobre as exportações, o que na visão do advogado tributarista está relacionado com as dinâmicas de mercado. “Isso é uma coisa que já vem ocorrendo, é uma questão que transcende os interesses da ordem jurídica interna, é uma relação internacional”.
“É o que se diz sempre, a gente exporta produtos e serviços e não tributos. O que acontece é que essa imposição é do próprio mercado internacional, que você acaba se sujeitando para ter um produto competitivo. Já existe isso no texto constitucional”.
As importações, no entanto, continuarão sendo tributadas. “Se você não tiver a tributação na importação, vai sempre poder, eventualmente, acontecer um desequilíbrio e até prejudicar internamente”.
O projeto cita que haja “adequado tratamento tributário” para cooperativas, bem como tratamento diferenciado e favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte. Segundo Chiesa, já existem tais determinações na tributação brasileira, mas não há definições. “Só existe a determinação desse tratamento diferenciado, mas a Constituição não estabelece como. Então fica um vazio a ser preenchido e que gera discussões”.
“A ideia, inicialmente, era ter uma tributação uniforme, sem grandes benefícios e reduções para que não vire um sistema muito modificado. Mas vamos ver como se desenvolve ao longo da votação, o que vai ser mantido. Acredito que se não se atender às diversas particularidades dos diversos sistemas, acho que dificilmente a reforma é aprovada”.
Redução de impostos
Além da alíquota única – que não foi definida ainda – haverá alíquota reduzida pela metade (50%) de impostos serviços de educação, saúde, medicamentos, transporte público, produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas, além de insumos agropecuários, alimentos para consumo humano e produtos de higiene pessoal, além de atividades artísticas e culturais.
Além disso, terá alíquota totalmente reduzida (100%) para gastos vinculados ao Prouni (Programa Universidade para Todos) e Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos). Produtores rurais com receita anual menor que R$ 2 milhões, valor atualizado anualmente pela inflação, também teriam alíquotas reduzidas a 100%.
Cigarro e bebida poderão ter mais impostos
Outro ponto descrito na reforma é que alguns produtos poderiam ter consumo desestimulado a partir do aumento de impostos, tais como bebidas alcoólicas ou cigarro, por exemplo. “Já existe essa determinação no ordenamento jurídico, que produtos essenciais têm de ser tributados de uma forma mais leve. A seletividade sempre existiu, desde 1988, na Constituição Federal, mas nunca foi aplicada”.
Segundo ele, produtos considerados essenciais não devem ter alíquota superior à alíquota modal, que é a alíquota média dos estados, que hoje fica em torno 17% a 19%. “Não é novidade, o sistema já contempla isso, que é a tributação com caráter fiscal ou extrafiscal. Há situações específicas dentro de um determinado imposto quando ele não tem propósito último de arrecadar, ou seja, colocar dinheiro nos cofres públicos, mas de alcançar outros objetivos”.
No caso de Mato Grosso do Sul, no entanto, o advogado avalia que o aumento de tributação de determinados produtos pode favorecer o contrabando de mercadorias ilegais. “Nosso estado tem fronteira seca e, portanto, isso facilita muito mais a entrada de produtos estrangeiros. É uma dificuldade de controle. São os problemas do sistema, quando você fecha uma porta, você abre outra. Consequentemente, tem que se intensificar as medidas de fiscalização e controle”.
Mudanças serão graduais
A proposta afirma que a carga tributária não deve mudar, mas que as alterações sejam feitas na próxima década, de forma gradual e proporcional. “A transição prevista é longa, mas necessária. Teríamos uma ruptura de sistema. Você vai ter, na verdade, mais um tributo convivendo com aqueles que já existem, enquanto eles vão reduzindo”.
“Vamos ver como vai caminhar a votação, mas acho que o processo deveria ser mais lento e de se trabalhar bastante em cima do texto. É claro que o primeiro passo vai ser o de alterar a Constituição e, na sequência, teremos lei complementar que trará delineamento mais preciso da tributação, com detalhes e o modo operacional”.
Outras mudanças da reforma tributária
Fundo de Desenvolvimento Regional: reserva será usada para compensação de estados e municípios, visando fim da concessão de incentivos na guerra fiscal. Durante a fase de transição, os entes poderão usar os recursos do Fundo para manter empreendimentos instalados. O relatório prevê Conselho Federativo, com a participação da União, órgãos estaduais e municipais, para administrar o recebimento dos impostos.
‘Cashback’: o relatório traz um modelo de devolução de impostos incidentes no consumo de famílias de baixa renda. O formato ainda não foi detalhado, mas o retorno deve ser imediato, no ato da compra.
Regimes Fiscais Específicos: os deputados recomendaram que alguns setores permaneçam com as próprias apurações de impostos, como: operações com bens imóveis, serviços financeiros, seguros, cooperativas, combustíveis e lubrificantes. O sistema financeiro, porém, não terá redução de carga tributária.
Zona Franca de Manaus: a manutenção do regime diferenciado para Zona Franca de Manaus está garantida. Mas não foi especificado no texto atual de que forma os benefícios fiscais serão mantidos com o fim gradual do IPI.
Tributação de renda e patrimônio: o relatório prevê a incidência de IPVA para veículos aquáticos e aéreos, de uso particular e recreativo. Os parlamentares sugeriram ainda uma cobrança progressiva conforme o impacto ambiental negativo do transporte. Já o ITCMD (Imposto de transmissão causa mortis e doação) deve se tornar progressivo. O tributo é cobrado sobre a transferência de bens doados ou ganhos em herança. Dessa forma, quanto maior o valor do bem a ser transferido, maior deve ser o valor da alíquota de ITCMD cobrada.
Fonte: CGNews
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